Mês de junho começando, mas os esforços em prol da conscientização da doença celíaca (DC) – através da comunidade celíaca – seguem a “todo vapor” e o blog Não Contém Glúten não poderia deixar de dar a sua contribuição.
Você já ouviu falar do MAIO VERDE? Sabe do que se trata? MAIO VERDE é o mês de conscientização da DC, que tem por objetivo, trazer informação a respeito de uma doença que afeta cerca de 1% da população mundial, mas que ainda é tão desconhecida e bastante negligenciada (inclusive no meio médico).
A doença celíaca é uma condição autoimune e genética (uma enfermidade crônica, que não tem cura), multissistêmica (podendo afetar vários órgãos), que é ativada pela ingestão do glúten (proteína encontrada no trigo, cevada e centeio, utilizada em uma grande parte dos produtos industrializados, além dos já tão conhecidos pães e massas). O celíaco pode (e deve) levar uma vida normal, ao deixar de apresentar os sintomas decorrentes do consumo do glúten, mas, para isso, tem que abdicar para sempre de qualquer alimento que contenha a proteína, atentando-se também para a tão temida contaminação cruzada.
Além de ter que adaptar-se a um novo estilo de vida – longe do glúten e de qualquer contaminação cruzada – o celíaco também necessitará encarar um novo padrão de consumo, bem mais alto. Sim, produtos sem glúten são bem mais caros do que os tradicionais (recheados da proteína que tanto nos inflama). Não falo de frutas, verduras e tubérculos, arroz e feijão, mas dos demais produtos que muitas pessoas consomem (como macarrão, pães, embutidos, queijos e produtos industrializados em geral), que fazem parte da feira mensal e que agora não poderão mais ser consumidos. Ademais de pagar mais caro, geralmente há a necessidade de serem comprados em lojas de produtos específicos, pois a oferta desses itens em redes de supermercados nem sempre é uma constante, além de, na maioria das vezes, serem armazenados e dispostos juntamente com produtos que contém glúten, correndo risco de haver contaminação pela proteína.
Mas, e aquelas pessoas que não têm condições de manter a dieta após serem diagnosticadas com a doença celíaca, justamente por ser um estilo de vida (leia-se não opcional) mais caro?
O Não Contém Glúten, juntamente com o Prato Livre, desenvolveu uma campanha sobre questões sociais ligadas à doença celíaca, chamada: SÓ INCLUSÃO ALIMENTAR NÃO BASTA. “O intuito da campanha é contar histórias reais de superação voltadas para questões sociais da comunidade celíaca, visando trazer reflexões sobre o tema”, afirma Kethleen Formigon, criadora deste Blog.
Pessoas que têm restrições alimentares: alergias, sensibilidades ou doenças autoimunes, sabem como é ter que lidar com essa questão dos valores da alimentação (sem mencionar as demais situações enfrentadas, como as dificuldades no convívio social).
Luciene Barbosa de Oliveira, 48 anos, assistente administrativa e moradora de Campinas-SP, foi uma das entrevistadas nessa pesquisa. De acordo com a Luciene, ela foi a única da família a ser diagnosticada com a DC (em setembro de 2021), com a idade em que se encontra atualmente.
Sua consulta foi realizada por um médico do SUS, que abordou de maneira nada esclarecedora a restrição alimentar que ela teria que enfrentar por toda a vida, enfatizando apenas a exclusão do glúten e tratando a contaminação cruzada como bobagem.
Após o diagnóstico, Luciene passou a ser acompanhada por uma reumatologista do SUS, pois além de apresentar alterações diversas (problemas na tireoide, osteopenia…), já se encontrava com patologias reumatológicas (artrose e artrite reumatoide) também decorrentes da DC tardiamente diagnosticada.
Ela fala, inclusive, que havia sido indicado um médico particular, especialista em doença celíaca, mas que não teve condições de pagar o valor da consulta, que estava em torno de R$ 600,00.
Luciene informa que depende do SUS e que na rede pública enfrentou inúmeras dificuldades: falta de conhecimento dos médicos com relação à DC, o fato de o SUS não ter especialista para atender os pacientes e a longa fila de espera por uma consulta com o gastroenterologista (ela já está há mais de um ano esperando), tendo que pagar um médico da rede privada para conseguir o diagnóstico correto. Diagnóstico esse, que foi dado através da endoscopia e colonoscopia três fragmentos, tendo como resultado, escala Marsh II e duodenite crônica com hipertrofia vilositária.
Com relação à dieta “gluten free”, ela menciona que os alimentos, mesmo os básicos sem o glúten, são bem mais caros, e, ainda assim, escassos nos supermercados de sua cidade. Luciene diz que o seu salário não cobre todas as suas despesas, especialmente agora com a restrição alimentar.
Se ela teve o apoio de amigos e familiares? Luciene fala que pôde contar com algumas pessoas, mas que ainda é tachada de hipocondríaca, exagerada e que adora chamar a atenção.
Ela menciona que ainda tem muitas dúvidas, medos, se sente perdida, sem rumo e sem orientação, que o SUS, além de não disponibilizar especialistas na doença, não fornece o devido encaminhamento. Também sente a necessidade de um apoio psicológico (fala que às vezes tem vontade de desistir de viver) mas que o SUS não encaminha mais para psiquiatras ou psicólogos, tendo ela que pagar atendimento particular quando tem condições, ou seja, raramente.
Com relação ao acompanhamento nutricional, ela diz que não tem, que consegue alguma orientação nas redes sociais que segue ou nos grupos que faz parte.
Luciene termina a entrevista dizendo que o SUS precisa de uma remodelação total. Que a doença celíaca, apesar de muitas pessoas já terem ouvido falar, é algo novo para a grande parcela da população. Quando ela fala em contaminação cruzada, ainda escuta dizerem que é “coisa da cabeça dela”, paranoia ou exagero. Ela menciona que os médicos, na sua maioria, não conhecem a doença celíaca de forma mais aprofundada e que, por fim, isso a faz sentir-se um E. T. ou um “peixe fora d’água”.
Além de ser uma doença pouca esclarecida no meio médico e que dificilmente é dada a ela a devida importância, podemos ver quantas lacunas se apresentam na vida de uma pessoa com a condição celíaca quando não é fornecido o acompanhamento necessário para o equilíbrio da saúde, e as sequelas que vão sendo deixadas pelo caminho – quer sejam elas físicas, psicológicas e/ou emocionais.
Somente discordo sobre as consultas no SUS, pois já tive plano de saúde e faziam pouco caso da anemia frequente, já no SUS fiz todos os exames e estou firme no Hospital de Clinicas
Fico feliz que a sua experiência no SUS tenha sido diferente e melhor do que a retratada no texto.